O tio Tiago
Tio Tiago
Assim era conhecido na vila.
Era tio de todos e de ninguém,
E mesmo Tiago seria o seu nome,
Mas certezas quem as tem.
Chegara um dia,
Vindo nem ele sabe de onde,
Ali ficara,
No vão daquela porta
Há muito já abandonada
Se tornara tio de todos.
Montou a sua oficina
Com todas as ferramentas.
As suas mãos fantasistas
E um canivete mágico.
Ao lado jaziam os materiais,
Pedaços de madeira,
Ranos e raízes.
Sentado manejava o canivete
Cortava,
Recortava,
Modelava,
Aparava
E a figura que se escondia
No interior da madeira, da raiz ou do ramo
Nas suas mãos delicadas surgia.
Nunca esculpia em segredo.
Havia sempre muitos pares de olhos,
Primeiro desconfiados,
Depois encantados
Com aquele homem
De cabeça branca,
Cabelos ondulantes até às costas,
Com mãos mágicas
Que de lixo da rua criava figuras deslumbrantes
A que só faltava o sopro da vida.
Para as crianças
O tio Tiago não era um homem.
Era o génio da madeira
Que os fazia ficar quietos,
Silenciosos,
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Esquecidos dos pais,
Da casa,
Da escola,
Do destino que levavam,
Para verem surgir dum pedaço de madeira,
Condenado à fogueira,
Melros e estorninhos,
Pegas e gaios,
Pombas e rolas
E até patos selvagens,
Que, em vez de descerem ao rio,
Vinham poisar nas mãos do tio Tiago.
As aves voavam de mão em mão.
Da mão do tio Tiago,
Às mãos das crianças.
Ficava feliz a vê-las voar
Nas mãos alegres da garotada.
Algumas vezes
Apareciam moedas num cantinho.
Os pais das crianças sabiam
Que o tio Tiago nunca as aceitaria
Sabiam que para o tio Tiago
O que fazia não era trabalho,
Era a sua missão.
Encher de vida e alegria
Aquela porta abandonada,
A rua,
A Vila,
E as crianças que ele amava.
Zé Onofre