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Notas à margem

Textos escritos em cadernos, em guardanapos, em folhas encontradas ao acaso, sempre a propósito, nunca de propósito. isto é "vou escrever sobre isto". Não é assim que funciono.

Textos escritos em cadernos, em guardanapos, em folhas encontradas ao acaso, sempre a propósito, nunca de propósito. isto é "vou escrever sobre isto". Não é assim que funciono.

Notas à margem

04
Dez22

Histórias de A a Z para aprender a ler e escrever - Livro II - Olavo, viajante das estrelas

Zé Onofre

Olavo, viajante das estrelas

OLAVO, VIAJANTE DAS ESTRELAS.jpg

 

Numa espécie de torre,

Erguida num canto de um terreiro

(Ou poder-se-á chamar-lhe jardim?)

Encimada por um andar envidraçado

Passava os dias o senhor José

Entre canudos

Grandes e pequenos,

Finos e largos.

 

A criançada passava para a escola,

Onde o velho professor os esperava

Para mais um dia de saber

Arrancado a cantigas

Acompanhado com solos de tamboretes

E melodia de foguetadas de lágrimas

E o senhor José lá estava

Sentado à sua mesa.

                                      

No regresso das aulas,

Um rapazinho, mais curioso do que os colegas,

Ficava como que encantado,

Paralisado com o olhar fixo

Naquelas paredes de vidro

Onde uma cabeça branca

Rabiscava horas a fio.

 

Às vezes esquecia-se das horas,

Do pai, da mãe, dos irmãos,

Deixava- se ficar.

Apenas acordava do encanto,

Quando o pai,

Acostumado às distrações do filho,

O chamava com um sorriso.

 

Porém, uma noite o pai de Olavo,

Assim se chamava o curioso,

Chegou tarde para o buscar.

Já o senhor José

O havia levado para a sala dos mistérios

E lhe enfiara um dos óculos,

Assim se chamavam os canudos,

Nos olhos

Orientando o seu olhar.

    

Aponte o óculo para longe,

Não, para a igreja não,

Ainda mais longe,

Mais além que a Senhora da Graça,

Que tal para o ponto mais alto da serra?

 

Olha, o sineiro a tocar o sino

Até parece que está aqui.

Agora, agora é o taxista

A descer o monte pelo meio da estrada,

Seguido por uma nuvem de poeira.

Olhou para a serra além do rio,

Nos vales verdes junto aos ribeiros

Lavradores chamam os bois

Que puxam os arados e as grades.

Mais acima encostado a um cajado,

Um pastor aparece mesmo ali

Com as ovelhas a entrar pelo óculo dentro.

 

Agora são horas de ires, Olavo.

O teu pai já está desesperado

Por não te encontrar.

Quando quiseres aparece

Numa noite sem luar e estrelada.

Alguém que te traga.

Então sim, Olavo,

Verás belezas de cegar os olhos.

Vai,

Não te esqueças do combinado,

Gritou-lhe do alto da escada.

 

Foi assim que numa noite estrelada

O senhor José ouviu os travões de um carro

Parar ao portão do terreiro-jardim.

Veio esperá-los

E conduziu-os diretamente

À sala de vidro,

Pomposamente chamada “observatório”.

O Olavo curioso olhou pelo óculo,

Apontou-o ao céu.

Parecia um louco,

De braços a dar a dar

Como se quisesse colher as estrelas.

 

Imaginava-se pendurado na estrela polar,

De lá saltava para Oríon,

Da cassiopeia fazia uma montanha russa,

Quando deu conta

Estava para além do céu conhecido.

    Zé Onofre