Canto triste IV
022/10/14
Como nos deixamos derrubar?
Vínhamos tão bem seguros
Da luta, lá longe começada,
Muito longe para agora acabar,
Sem serem atingidos os futuros,
Que nossos avós iniciaram do nada.
Olhemos, para ver, à nossa volta
Para ver se entendemos em que curva
Da longa caminhada nos perdemos.
Como é que a gente de esperança à solta,
Como bandeira, de repente fica turva
Desiste de ter o futuro que merece.
Será que acredita nos agourentos
Que dizem que está enganada,
Que uma sociedade onde a gente é igual,
Só cabe na cabeça duns loucos violentos?
Porém, havia mais loucos entusiasmados
Com uma sociedade sem a ditadura do capital.
O capital, como qualquer outro poder,
Não vai desistir. Muda de estratégia.
Muda o rosto, e cria a social-democracia.
Consegue, com essa farda, não perder
O comando. Finge que recua, demagogia,
E com boa publicidade é só esperar para ver.
Como é que tantos se deixaram enganar?
Não sabem que ninguém dá nada de graça?
Assim iludidos tornaram-se bons aliados
De quem vive apenas para os explorar.
Nos gabinetes há quem idealiza e trace
O modo de vencer os mais desconfiados.
Como nos deixamos derrubar?
Vinha de longe, de tão longe a luta,
Conquistando tanto, para perder tudo,
Que custou suor e sangue a conquistar.
Talvez tenhamos perdido o dom da escuta
E o nosso discurso tivesse ficado mudo.
E agora o que nos resta para fazer
Neste tempo tão difícil para lutar?
De longe, tão longe, aqui chegamos
Para arribar à praia e desfalecer?
Não meus irmãos, temos que continuar.
Se não, por que é que aqui estamos?
Zé Onofre