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Notas à margem

Textos escritos em cadernos, em guardanapos, em folhas encontradas ao acaso, sempre a propósito, nunca de propósito. isto é "vou escrever sobre isto". Não é assim que funciono.

Textos escritos em cadernos, em guardanapos, em folhas encontradas ao acaso, sempre a propósito, nunca de propósito. isto é "vou escrever sobre isto". Não é assim que funciono.

Notas à margem

01
Dez22

Dia de Hoje 77 - Canto triste XIII

Zé Onofre

77

 

Canto triste XIII

 

022/11/28

 

Andaremos nas ruas novamente

De olhos sorridentes, cara lavada,

De cabeça livre, mente libertada

Da dúvida que atormenta a gente.

    

Será que nos iludimos com a luz,

Que de repente apagou a escuridão,

Cadeado que nos prendia ao chão,

E vimos ali a redenção da cruz?

 

Afinal iludimo-nos e não pouco,

A revolução há tanto querida,

Acabava morta numa flor erguida

No cano de uma arma por um louco.

      

Banalizaram as nossas canções,

Repetiram-nas como divertimento

Retiraram-lhes todo o fermento

Que cantariam novas revoluções.

 

Os jovens, agora, já não usam a rua

Como o faziam seus pais, tios e avós

Convivem nas tecnologias estando sós.

Desconhecem o poder de conspirar à lua.

 

É pedir muito que as praças novamente

Se encham de revoltas canções de futuro

Que evitem que este se torne no duro

Passado dos ditadores de antigamente?

 

Partilhemos as ruas novamente

Com canções da revolução adiada,

Que tem de ser do chão levantada.

Cantemos, de novo, que a luta é urgente.

   Zé Onofre

 

14
Nov22

Dia de hoje 75 A - Canto triste XII

Zé Onofre

                 75 A

 

                   Canto triste XII

 

022/11/13

 

Neste momento duro, feroz, estéril de sentido

De rota perdida, sem norte, nem bússola

Da vida em tudo afastado;

Onde nem poeta sonha, ou voz canta,

Nem criança tem doce sorriso;

Cujo nome, das gentes conhecido,

É democracia, na verdade, ditadura.

 

A qual a propaganda

Elevou às alturas

De verdade absoluta

Onde uma dúvida à sua verdade

É sinal, de herética malvadez,

Saudade de uma experiência falhada.

 

Sendo uma amostra onde

O desejo de um regime vil se esconde;

Nele aparece o governo que se encosta

Ao regime, que vem em crescendo,

Do século dezoito, liberalismo chamado

Que conforme o tempo foi volvendo,

A sua língua de mel-veneno composta,

Outros nomes lhe têm dado.

 

Agora como vento quer apressado

Derrubar com o seu longo braço

Tudo que a luta operária obteve

Tida pelo capital como desventura.

Agora, nesta hora de retaliação pura  

O imperialismo, num momento breve,

Quer que a luta operária fique sem espaço,

Que para sempre a exploração  

Mantenha, em todo o mundo, dominação. 

 

Aqui chegamos, vivendo tristes os dias,

Que enganados fizemos maus, solitários,

De desprezo e de humilhações cheios,

Trabalho forçado indigno de operários,

Depois de lutas duras terem tido direitos e regalias.

 

O capital com vãs promessas de cofres cheios

Põem os operários sozinhos com os seus meios,

A lutarem contra a sua própria natureza.

Não reparam que quem assim os ilude,

Quer que percam, da união, a memória  

De lutas duras em que lhes sorriu a vitória.

Que esqueçam a gente que na união viram a virtude,

Para acabar com o capital com toda a certeza,

Que, apesar de à exploração e ignorância sujeita, sabia

Que um mundo sem exploradores haver poderia

   Zé Onofre

 

03
Nov22

Canto triste IV

Zé Onofre

Canto triste IV

 

022/10/14

 

Como nos deixamos derrubar?

Vínhamos tão bem seguros

Da luta, lá longe começada,

Muito longe para agora acabar,

Sem serem atingidos os futuros,

Que nossos avós iniciaram do nada.

 

Olhemos, para ver, à nossa volta 

Para ver se entendemos em que curva

Da longa caminhada nos perdemos.

Como é que a gente de esperança à solta,

Como bandeira, de repente fica turva

Desiste de ter o futuro que merece.

 

Será que acredita nos agourentos

Que dizem que está  enganada,

Que uma sociedade onde a gente é igual,

Só cabe na cabeça duns loucos violentos?

Porém, havia mais loucos entusiasmados

Com uma sociedade sem a ditadura do capital.

 

O capital, como qualquer outro poder,

Não vai desistir. Muda de estratégia.

Muda o rosto, e cria a social-democracia.

Consegue, com essa farda, não perder

O comando. Finge que recua, demagogia,

E com boa publicidade é só esperar para ver.

 

Como é que tantos se deixaram enganar?

Não sabem que ninguém dá nada de graça?

Assim iludidos tornaram-se bons aliados

De quem vive apenas para os explorar.

Nos gabinetes há quem idealiza e trace

O modo de vencer os mais desconfiados.

 

Como nos deixamos derrubar?

Vinha de longe, de tão longe a luta,

Conquistando tanto, para perder tudo,

Que custou suor e sangue a conquistar.

Talvez tenhamos perdido o dom da escuta

E o nosso discurso tivesse ficado mudo. 

 

E agora o que nos resta para fazer

Neste tempo tão difícil para lutar?

De longe, tão longe, aqui chegamos

Para arribar à praia e desfalecer?

Não meus irmãos, temos que continuar.

Se não, por que é que aqui estamos?

    Zé Onofre