Por aqui e por ali 17
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982/04/01
Se me permite,
Minha senhora.
Eu
Falo-lhe em cães,
Gatos e coelhos,
Milho e centeio,
Vindimas e desfolhadas
Porque, raios
E carga de água,
A senhora me fala
De meninos bem comportados?
Porque me fala
Em príncipes encantados,
Ou não.
A mim, pobre criança,
Que palmilho
Descalço
Nunca as lonjuras do sonho,
Sempre as pedras ásperas do caminho?
Fala-me
Do que não entendo
E nunca dos montes e dos ninhos
Dos campos verdes onde me rebolo
Nas tardes amenas da Primavera,
Enquanto a vaca,
Pachorrenta vaca pasta.
Fala-me de casas,
De janelas
E não da lonjura dos horizontes
Lá,
Onde o verde dos pinheiros,
E o azul do céu, se misturam.
Lá
Onde o vento sopra forte
Em Agosto.
Lá onde os passarinhos voam
Em asas de sonho!
Lá,
A beleza,
O sonho
Voam
Em planuras de Liberdade.
Porque me fala
De grades,
Paredes,
Prisões,
A mim que sou livre,
Travesso,
(Assim o diz)
E gosto de movimento!
Porquê?
A srª professora fala-me,
Fala-me,
De letras, e sílabas e palavras,
Ou de palavras, sílabas e letras.
Srª professora
Ajude-me a falar,
A falar,
Sobre o meu porco morto.
Zé Onofre