Rebusco 5
5
989/11/30
Voamos,
Aves desatinadas,
À procura do sol.
Corremos,
Seres sedentos de futuro,
À procura do vento.
Corremos, ou voamos,
Seres sem presente,
À procura de raízes
Que nos digam quem somos.
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5
989/11/30
Voamos,
Aves desatinadas,
À procura do sol.
Corremos,
Seres sedentos de futuro,
À procura do vento.
Corremos, ou voamos,
Seres sem presente,
À procura de raízes
Que nos digam quem somos.
312
022/12/13
Sobre Banalidades em desabafos (sapo.pt), Romi, em 022/11/21
Andamos numa roda-viva,
Cheios de pressa como a lebre,
Vindos de algures,
Indo para nenhures,
Procurando não sabemos o quê,
Nem para que fim.
Autênticos maratonistas,
Carregando tralhas
Que nos são importantes,
Nunca nos interrogando
O por quê da sua utilidade.
Parecemos esquilos
A acumular avelãs.
Vivemos para um futuro
Enquanto esquecemos o presente,
Que é o que temos,
Adiando-o
Para um futuro incerto.
Regressamos de nenhures
Voltamos a algures.
Entramos numa casa,
Atirámo-nos exaustos
Para um repouso
Refazer forças para no dia seguinte
Repetir todos os outros dias
Zé Onofre
96
996/05/12, visita a uma amiga instalada no asilo, Amarante
Aqui estão parados,
Simulando que vivem.
Aqui estão a viver um tempo
Que não existe,
A gastar um sopro
Que está suspenso.
Aqui estão
Envoltos num passado,
Num presente suspenso
Que não terá futuro.
Aqui estão desertos de sonhos,
Suspensos do tempo,
Ausência do hoje,
Sem possíveis amanhãs.
Zé Onofre
63
03/03/978
Solidão
É ter o direito de dizer a nossa palavra
E calá-la.
É ter espaço para a gritar
E não o aproveitar.
É ter pernas
E não querer andar.
É ter olhar
E não querer ver.
Solidão
É o diz-se, diz-se
Das mesas do café.
É o murmúrio
Nos recantos dos corredores.
É ter a luz acesa
E apaga-la.
Solidão
É ter o dever de falar
E calar.
É ter o dever de ocupar o espaço
E abandoná-lo.
É ter o dever de andar
E amarrar as pernas.
É o dever de olhar em frente
E baixar os olhos.
Solidão
É querer estar só.
São estas paredes cheias
Do silêncio das nossas vozes.
É vazio gritado
De murmúrios.
É o sussurro bichanado
Ao ouvido do teu amigo.
Solidão
É ter o dever de estar presente
E fugir.
É direito de estar
E não o usar.
Zé Onofre
57
11/01/978
Ó criança
Perdida
Nos meandros de teias
Em que te metemos.
És
Lampejo gritado
Nos sons da noite.
És relâmpago
Deslumbrante
De sons em cântico.
És
Presente
Espraiado
Nas margens do futuro.
Canto-te
Cor florescida
No chão
Semeado de pedras.
Canto-te
Som sofrido
No pântano
Semeado de medo.
Canto-te
Bem alto
Alegria que te quero
Das minhas mãos.
Elevamos-te
Bem alto
Alegria das nossas mãos.
Zé Onofre
32
29/04/975
Os dias cinzentos e chuvosos
Ficaram ternos e saudosos,
Melancólicos.
As recordações entram de mansinho.
De repente os olhos
Enchem-se de vida, de brilhos
Que iluminam o presente.
Aqui, sentado a esta janela,
Ténue fronteira
Entre o ontem e o hoje.
Escorre dela os belos dias de criança.
Dias sempre azuis,
Nem que o céu cinzento negro,
Despejasse águas a cântaros,
Ou enchesse a vida
Com raios e trovões,
Eram sempre azuis.
Eram azuis quando rolávamos
Verdes nos campos.
Eram azuis, quando rindo,
Tentávamos um beijo do nosso amor.
Eram azuis
As caras dos amigos
Os brinquedos que inventávamos.
Eram azuis
As tardes longas de sol
Era azul,
O sol que se derramava em nós.
Eram azuis
As águas corredias nos regos e riachos.
Era azul
O ralho da mãe
- Se adoeceres
Nem um copo de água te levo à cama. –
Azul,
Aquela nossa vida
Saltar de rego em rego,
Construir enormes barragens,
Lagoas como mares,
Pontes, as maiores do mundo
(Três pedras,
Varas caídas da poda
E o cimento, lama)
Obra-prima da engenharia.
Azul
Era o tempo, em que enleados,
Admirávamos a obra feita.
Azuis
Eram os sorrisos felizes
Estampados no rosto,
E desfaziam em pó
Os ralhos ternos da mãe.
Azul,
Embora esbatido,
É esta melancolia
De espreitar a infância
Pela frincha do tempo.
Azul,
Embora esbatido,
É espreitar os campos,
Ainda cheios de vida,
Agora abandonados
À incúria dos tempos.
Vieram os anos,
Olho para dentro de mim
Onde ontem,
Vejo azuis ossos encharcados.
Hoje,
Apenas ossos pesados.
Vieram os anos,
Olho para dentro de mim.
Onde ontem,
Há sombras azuis de amores,
Olhos azuis que eram azuis,
E azuis continuam,
Apesar das lágrimas
Que hoje
Teimam em diluí-los.
Nesse azul claro
Uma nova onda nascerá
Sem angústia,
Sem desespero da loucura
Da vã procura.
Nas ruas da solidão
Estará o azul
À minha espera.
Zé Onofre