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Notas à margem

Textos escritos em cadernos, em guardanapos, em folhas encontradas ao acaso, sempre a propósito, nunca de propósito. isto é "vou escrever sobre isto". Não é assim que funciono.

Textos escritos em cadernos, em guardanapos, em folhas encontradas ao acaso, sempre a propósito, nunca de propósito. isto é "vou escrever sobre isto". Não é assim que funciono.

Notas à margem

17
Fev23

Rebusco 23, 24, 25

Zé Onofre

               23

 

092/07/08, Porto

 

Somos professores,

Não somos missionários,

Somos seres humanos.

Somos professores, apenas.

 

               24

 

092/07/08, Porto

 

Até que ponto

A transformação da “cultura”

Num bem de consumo,

A desvaloriza,

E a assassina?

 

               25

 

092/07/08, Porto

 

Até que ponto

O insucesso escolar

Decorre da massificação do ensino.

Não será

Que se confundiu massificação

Por democratização?

   Zé Onofre

13
Abr22

Por aqui e por ali 92

Zé Onofre

              92

 

996/02/12, encontro do SPN, CMA, Amarante

 

Está na hora

De olhar o horizonte

E descobrir mais além.

 

Está na hora

De deixarmos de ser comparsas activos

Na destruição do nosso melhor,

A Utopia.

 

Está na hora

De acabar com as negociações,

O futuro não se negoceia,

Cumpre-se

 

Está na hora

De mudar o rumo,

Não de remendar caminhos,

Que está visto não é o caminho.

 

Está na hora

De exigirmos mais e melhor.

De gritarmos bem alto –

Esta não é a escola que respeita os alunos.

Esta não é a escola que satisfaz os pais.

Esta não é a escola que dignifica os professores.

Esta não é a escola que constrói futuros.

Esta é a escola dos sonhos desperdiçados.

 

Está na hora

De edificarmos uma escola nova

E não de nos acomodarmos –

Em opiadas discussões de estatutos e escalões.

E não de negociar os escombros

Da escola que resta.

 

Está na hora

De pensar, escutar e olhar,

De não mais sermos tratados como regateiros

A discutir o preço do linguado.

 

Está na hora

De assumir a nossa dignidade.

Dignidade que não se conquista

Com discussões estéreis

Que nos roubam argumentos

E destroem o orgulho que ainda nos resta,

 

A dignidade conquista-se

Com a exigência de uma escola,

Crítica, experimental e não seguidista

Dos ditames de uma sociedade

Que tudo reduz ao sucesso dos cifrões,

E principalmente aos bens consumidos.

 

A dignidade conquista-se

Com a recusa da escola armazéns de matéria-prima

De meninos com que se fazem chouriços.

Os que não são perfeitos são excluídos

Lançados à máquina do lixo,

Farinha para engorda dos barões da droga.

 

A dignidade conquista-se

Exigindo-se condições

Onde cada um seja cada um

E não a redução ao tipo médio.

 

A dignidade conquista-se

Com a recusa das condições desumanas

De ritmos arbitrários que tudo reduzem

Ao Máximo Divisor Comum.

 

A dignidade conquista-se

Com a recusa da escola sardinha em lata.

Com a recusa da escola-cidade

Onde os professores não conhecem o vizinho do lado,

Quanto mais os habitantes da rua, os alunos.

 

A dignidade conquista-se

Exigindo uma escola que não mais seja

Quatro paredes recheadas de mobiliário

Do mais sofisticado que haja,

Ao mais antiquado e artesanal,

Quadro preto, giz e cuspe.

 

A dignidade conquista-se

Ajudando a construir uma escola,

Onde todos os que lá trabalham

Se despeçam “até amanhã”

Como quem espera o beijo da mãe,

O encontro ansiado com o amigo,

O abraço apertado dos enamorados,

Ou apenas a terra onde “corre o leite e o mel.”

 

A dignidade conquista-se

Vendo “claramente visto” que o rei vai nu.

 

A escola vai nua porque diz –

Sou para todos –

Mas só se o for na rejeição dos inadaptados.

 – Sou obrigatória durante nove anos –

E limita-se a burocratizar pessoas,

A reduzir a estatísticas os alunos.

 

Está na hora

De termos coragem de enfrentar os alunos,

Dizer-lhes, como quem pede perdão,

Tendes razão, abrimos os olhos tarde.

De termos coragem de enfrentar os pais,

Dizer-lhe como quem reconhece uma culpa,

Tendes razão em não confiardes totalmente na escola.

De termos coragem de enfrentar o ministro

E dizer-lhes com toda a clareza necessária,

Este não é o momento para esta discussão.

O problema está para além de estatutos.

O problema está para além das carreiras.

O problema está para além dos escalões.

O problema está para além de mais ou menos tostões.

 

Está na hora

De encararmos os alunos, olhos nos olhos,

E pedir perdão por cada vez que gritaram,

Como quem pede socorro, e nós os calamos.

E pedir-lhes perdão por cada vez que nos chamaram,

E altivamente nem para eles, olhamos.

Perdão por todas as vezes que se atravessaram,

De propósito nos nossos caminhos, e prosseguimos

Altivamente em frente e com a nossa pressa

Vos Arredámos não sabemos para onde.

 

Por favor,

Não mos julgueis com muita severidade.

Tal como vós chamamos e ninguém nos responde,

Apenas um eco repete e distorce até o infinito

O nosso repetido e sentido apelo.

Tal como vós nos sentimos esmagados e trucidados

Por esta escola cega, surda e muda.

 

Vamos então fazer um pacto –

Vamos ajudar-nos mutuamente.

Olhai para nós, não como carrascos,

Mas como amigos.

Olhai para nós, não como iluminados,

Mas tateantes a fazer o caminho.

Olhai para nós não como carcereiros,

Das vossas alegrias e angústias,

Mas como uma janela

Onde vos podeis debruçar

À procura do horizonte.

Olhai para nós

Como seres que entre o medo de errar,

E as certezas de não nos enganarmos,

Vivemos entre horrores e alegrias.

Finalmente, olhai para nós e vede

Que somos pessoas, apenas pessoas,

Como todas as pessoas sujeitas a erro.

 

Pais, também convosco, queremos fazer um pacto.

Antes, porém, julgai-nos com benevolência.

É certo que nem sempre nos entendemos,

E ajudemo-nos na jornada dos vossos filhos.

Ajudai os vossos filhos a descobrir a felicidade

Da descoberta e da conquista.

Não tenhais pressa que os vossos filhos

Tenham tudo, deixai algo, o mais importante,

Para ser a conquista deles.

Deixai que sejam eles a chegar mais longe,

Nem que apenas o mais longe seja ali,

Sim, ali no fim da rua, ao virar da esquina.

 

Senhor ministro,

Por agora prometemos exigir, apenas, esta escola.

 – Pequena,

Onde todos se conheçam pelo nome próprio,

E não pelo terror do quinto E,

Ou pelo filho do João da Esquina,

Ou a s’tora, a fera da matemática.

– Espaçosa,

Onde cada um tenha direito à sua privacidade,

Não se sentir invadido pelos outros.

 – Rica,

Em espaços diferenciados,

Em actividades alternativas,

Que proporcionem a cada um

A realização do ser humano

Em busca da felicidade.

– Exigente

Na crítica e autocrítica,

Nos comportamentos e atitudes,

De cada uma das pessoas que lhe dão corpo.

 

Depois, então, falaremos de remunerações. 

Zé Onofre

17
Fev22

Por aqui e por ali 59

Zé Onofre

                 59

 1989/09/13

 

 Professores,

Cidadãos da dúvida,

Construtores em projeto

De novos projetos.

 

Professores

Caminhantes de um caminho,

Por fazer,

Balizado entre o que é

E o que deve ser.

 

Professores,

Cidadãos da angústia,

Construtores de um sentido,

Sem demissão,

Modelando hoje

O incerto amanhã.

Zé Onofre

04
Dez21

Poraqui e por ali 10

Zé Onofre

                10

 

981/__/__

 

O método.

 

Há quem diga e afirme

Que é preciso mudar o método.

Que aí reside a essência

Que mudando-o muda tudo.

 

Há quem ao contrário pense

Que o método é pouco importante

Se de facto fosse cosa séria

Não estaria em mudança constante.

 

Houve então um inteligente

Que o verdadeiramente  Fino

Necessário e urgente é sim

Que os professores façam o pino.

Zé Onofre

 

03
Nov21

Daqui e por ali 4

Zé Onofre

4
Gouveia, 1981/01/07

A minha escola tem
Professores,
Meninos,
Meninas.
Os professores são muito bons
Muito, muito bonitos.
Os meninos e as meninas
Também são.
Eu gosto muito da minha escola.

O recreio da minha escola
Tem um muro a toda a volta,
Pedras,
Muitas pedras no alto,
Tem, também,
Lama no Inverno.
O recreio da escola
É pequeno para brincar.

Zé Onofre