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Notas à margem

Textos escritos em cadernos, em guardanapos, em folhas encontradas ao acaso, sempre a propósito, nunca de propósito. isto é "vou escrever sobre isto". Não é assim que funciono.

Textos escritos em cadernos, em guardanapos, em folhas encontradas ao acaso, sempre a propósito, nunca de propósito. isto é "vou escrever sobre isto". Não é assim que funciono.

Notas à margem

09
Jan23

Histórias de A a Z para aprender a ler e escrever - Livro II - Aurélio na Terra do avô

Zé Onofre

Aurélio na terra do avô

 

 

AURÉLIO NA ALDEIA DO AVÔ.jpg

 

Aurélio viajava, e não era pela primeira vez,

Para a aldeia onde viviam o avô e a avó.

Lembrava-se que os visitava, talvez, umas três

Alturas por ano. Esta não era uma visita só.

 

Hoje dirigia-se para a Terra natal do pai,

Não para fazer mais uma visita familiar

Como as que fazia nas festas e férias. Vai

Porque está doente para tentar repousar.

 

Uma dessas ocasiões ocorria no Verão.

As estradas que tinham, sem exagerar,

Mais curvas que quilómetros, eram então

Espiche, buracos e terra, pareciam não acabar.

 

Saíam de manhã cedo antes de nascer o sol.

A viagem começava com o carro voando

Porém, depressa rolavam a passo de caracol.

Quando chegavam já a noite ia entrando.

 

A ida por velhos caminhos será menos demorada.

Ainda será, mesmo assim, longa para recordar

Os primos, as primas e os amigos. A tratantada

Começava de manhã cedo e ia até o dia acabar.

 

As tardes de verão no rio eram de encantar.

Nadar, saltar de pontos altos para a água, subir

E descer o rio no barco a remar e a cantar.

A última automotora dizia a hora de partir.

 

O monte tinha sempre algo para ofertar.

Na primavera o rosmaninho, o tapete pascal.

Pela senhora da Graça as pinhas para queimar.

No inverno, o musgo para o presépio de Natal.

 

Nestas andanças com os primos desde a aurora

À noite, de qualquer lugar fosse ele alto ou fundo,

Estava a linha por onde serpenteava a automotora.

Na automotora, sonhava Aurélio, correria o mundo.

 

Parecia que o pai tinha o dom de adivinhar

Os mais loucos sonhos que Aurélio tinha.

Um dia foram todos para a estação esperar

A automotora para viajarem até ao fim da linha.

 

O pai, na viagem de volta, levou-o ao motorista

Que o convidou a entrar e permitiu-lhe tocar

A buzina. Aurélio mostrou-se um hábil artista.

A automotora veio em festa até a viagem acabar.

  Zé Onofre

15
Dez22

Rebusco 2

Zé Onofre

2
989/10/11

I

José correu,
Depois voou,
Perdeu-se no azul.

Restou dele
Apenas uma réstia
De nada.
Foi feliz.

II

Passamos o tempo
A perder o tempo
A lamentar o tempo perdido.
Somamos tempo perdido
A tempo perdido.
Quando usaremos o tempo,
Que nos é dado,
Para construir
Um tempo acrescido
De felicidade?

III

Rasgamos
Com fúria,
As condições primeiras da felicidade.
(Ternura,
Ternura e mais ternura).

Depois
Recordamos metodicamente
Os sonhos perdidos
Ao amanhecer.

IV

Pegamos em crianças.
Que fazemos delas?
Macaquinhos amestrados
A Responder a estímulos?
Macaquinhos pequeninos
Muito bem ordenadinhos?
Meninos comportadinhos,
Pequenos homenzinhos?
Ai escola, escola.

V

Pura poesia
É
A vida em movimento.

O parado
É
Sofrimento.

A escola parada
É
Tristeza pura.

Secas
São as vidas torturadas
Nos bancos da escola.

Secas
São as palavras
Que, frias, escorrem
Dos lábios das crianças
Sem sentido,
Sem ardor.

    Zé Onofre

31
Out22

Canto triste II

Zé Onofre

Canto triste II

 

022/10/12

 

Amigo

Tão perdido no vento

Por esses caminhos do desalento.

Porque desperdiças o tempo

E não o somas ao de alguém.

 

Em cidades

Em vilas e aldeias

Porque passas sem olhar bem

Não saberás que há outros à tua beira

Que sofrem também.

 

Vê que

Vê que se ficas só

Não irás a qualquer parte.

Deixa que os sonhos dos outros

Sejam os teus sonhos também.

  Zé Onofre

18
Out22

Histórias de A a Z para aaprender aa ler e escrever - Livro I - BELA

Zé Onofre

Bela

BELA.jpg

 

 

Numa casa

no meio da floresta

vive uma menina

com o pai e mãe

mais a sua boneca.

 

A menina,

de seu nome Bela,

de rosto lindo

a dizer

com o nome dela,

brincava,

com a sua boneca de trapos

até a deixar tonta

ao jogo do faz de conta.

 

Agora....

És a gata borralheira

escrava da madrasta má

e das tuas irmãs.

 

Agora...

És a Bela adormecida

em tua cama de cristal

à espera do príncipe                                                    

Em seu cavalo real.

 

Agora...

És...

 

Com a boneca nos braços

a Bela adormeceu.

 

No meigo colo

de sua mãe.

 

Em sonhos continua

a vestir de sonhos

e formosura

a boneca de trapos

que abraça com ternura.

18
Mai22

Por aqui e por ali 127

Zé Onofre

                 127

 

011/02/12, EB2.3, Vila Caiz, Amarante        

 

Olhemos as páginas escritas.

Nelas nada há de sonhos,

Nada há de mistérios,

Nada há de aventura.

 

Corramos pelas páginas brancas

Em busca do vento,

Em busca das labaredas,

Em busca do infinito,

Em busca do desconhecido.

 

Se de repente

Na esquina alva

De uma linha por escrever,

Nos aparecer a luz,

Nos surpreender uma sombra,

Tropeçarmos numa mágoa,

A subtileza de um amanhã,

Teremos então a certeza

– A viagem não foi em vão. –

  Zé Onofre

26
Abr22

Dia de hoje 105

Zé Onofre

                   105

 

997/06/14

 

Regresso

 

Hoje regressais ao passado.

Cada um de vós vieste ao encontro

Do vosso passado.

Hoje, cada um de vós visita,

Revisita as suas ilusões,

As suas esperanças,

Os seus sonhos.

Hoje regressais

Aos vossos vinte anos.

Aos vinte anos de cada um.

Em sorrisos, risos, de olhos perdidos,

Olhando-vos uns aos outros de longe,

Recordais, não o mesmo passado

Que em comum a vida por acaso vos deu,

Mas o passado que cada um construiu,

Ano após ano, dia após dia.

Um passado

Que cada um de vós construiu

À medida dos vossos sonhos,

Ou à medida do que a vida permitiu.

Passaram vinte e cinco anos.

E com eles muitos outros valores se alteraram.

Sonhos e esperanças,

Alegrias e tristezas,

Saudades, fantasias,

Desesperos, Melancolias.

É com estas vestes que hoje,

Vinte e cinco anos depois,

Regressais a um passado,

Em que o acaso vos juntou,

Num momento e num espaço.

Cada um de vós vem arranjado

Com as vestes

Que a vida lhe proporcionou.

   Zé Onofre

20
Abr22

Por aqui e por ali 98

Zé Onofre

                  98

 

996/11/24

 

De repente sinto que o Natal

Morreu dentro de mim.

 

Que caminhos percorri,

Que sonhos desperdicei?

 

Tudo sabe a esforço,

Voluntarismo,

Racionalidade.

Tudo é

Porque tem de ser.

 

Já nada é

Sonho ou alegria,

Revolta ou ousadia.

Tudo é razão, razão, razão.

 

Em que canto,

Em que esquina,

Em que parte de mim próprio me perdi?

  Ze Onofre

17
Abr22

Por aqui e por ali 96

Zé Onofre

                 96

 

996/05/12, visita a uma amiga instalada no asilo, Amarante

 

Aqui estão parados,

Simulando que vivem.

Aqui estão a viver um tempo

Que não existe,

A gastar um sopro 

Que está suspenso.

Aqui estão

Envoltos num passado,

Num presente suspenso

Que não terá futuro.

Aqui estão desertos de sonhos,

Suspensos do tempo,

Ausência do hoje,

Sem possíveis amanhãs.

  Zé Onofre